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Este é o 17º artigo de 46 posts da série Entre Homens e Lobos.

O vilarejo estava meio deserto e apenas algumas lamparinas permaneciam acesas quando Dareon largou a carcaça do enorme urso que estivera devorando e voltou para junto da Prefeita.

– Finalmente vamos todos para um lugar seguro – disse Gwen Armstead. – Isso inclui você.

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Dareon notou o dedo indicador da Prefeita apontado em sua direção.

– Oh. E há algo mais que eu possa fazer para ajudar? – quis saber de imediato.

– Por aqui, não – Gwen balançou a cabeça. – Mas, se não tiver nada mais para fazer, pode partir para o Solar dos Greymane agora e dar uma mãozinha por lá.

– Eu estava planejando me embrenhar na floresta e caçar umas presas…

Gwen Armstead encolheu-se ligeiramente e o encarou, sem reação.

– Só estou brincando, Gwen – disse Dareon, rindo sua risada rouca e canina. – É claro que posso partir, que tipo de compromisso teria um worgen? Além do mais, eu ganho comida suficiente por aqui. E você, vai ficar?

– Preciso garantir que todos saiam daqui inteiros – a Prefeita suspirou. – Obrigada por tudo. Não se preocupe comigo, irei assim que puder. Ah, quando chegar lá, fale com a Rainha Mia Greymane para saber mais sobre a gravidade da situação… E, você sabe, ver se ela precisa de algo…

Dareon desejou-lhe sorte e solicitou a um dos vigias que lhe arranjasse um cavalo com urgência.

– É pra já, chefe! – gritou o vigia, correndo até o  mestre de estábulo do Refúgio do Ocaso.

O baio negro relinchou quando Dareon pulou sobre sua sela, reclamando do peso exagerado sobre suas costas. Calma lá, amigão, Dareon dizia mentalmente enquanto cavalgava rumo ao Solar dos Greymane, alisando a comprida crina do cavalo, e o bicho parecia realmente se acalmar.

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A estrada tortuosa que precisou subir estava lisa e perigosa devido à chuva, mas o baio deu conta de levá-lo até os portões do Solar, abertos por um guarda mal-humorado que pegou as rédeas do cavalo a contragosto e o arrastou até os estábulos.

Logo na entrada, uma jovem de cabelos vermelhos o observava, sentada no banco da frente de uma diligência de luxo que, ao que parecia, havia acabado de estacionar. Sobre o vagão, no compartimento de bagagens, uma silhueta conhecida acabava de se levantar.

– Ei, Lorna! – Dareon gritou, acenando freneticamente, e viu a enorme carabina ser apontada em sua direção pela segunda vez em poucos dias. – Sou eu! Nem comece a engatilhar essa carabina, já me deu trabalho demais fazer com que a abaixasse uma vez.

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Lorna Crowley riu baixinho e soltou a arma. Sem descer de cima da diligência, acenou de volta, sorrindo.

– Desculpe – disse. – Não notei que era você. De novo.

– Deve ser difícil, realmente. Nós somos todos iguais, não é? Escuros e peludos… – Dareon brincou. – Onde está a Rainha? Aquele rapaz simpático que abriu os portões estava com pressa para pegar meu cavalo e não me deu nem oi.

– Lá em cima, no Solar – Lorna esticou o dedo na direção da mansão em que viviam os Greymane. – Pode subir. Nós logo vamos também.

– Até mais tarde, então.

Havia mais estradas lisas e estreitas para subir até o topo do morro, onde se erguia o majestoso Solar dos Greymane. Era o que Dareon pensava do palácio, até chegar perto o bastante para notar que a desolação abatera até a parte mais alta de Guilnéas. Papeis voavam ao acaso, as lamparinas rangiam com o vento, e vários aldeões ensopados faziam vigília nas escadas da mansão, reunidos em pequenos grupos, murmurando especulações entre si.

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A luz quente e aconchegante que vinha de dentro do Solar parecia artificial e pouco convidativa naquele momento. A porta estava aberta e, antes mesmo de entrar, Dareon identificou a figura pálida da Rainha Mia Greymane, parada no centro do grande saguão, tão incrivelmente solene e radiante como se possuísse uma fonte de luz própria.

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Ao longo do corredor, algumas dezenas de cidadãos de Guilnéas e aldeões de Refúgio do Ocaso despejavam ao mesmo tempo suas preocupações sobre a Rainha, que tentava inutilmente apaziguar a situação e manter a ordem entre os refugiados.

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– Fiquem todos calmos! – dizia Mia, tentando fazer com que sua voz se sobressaísse às demais. – Já aprontamos as carruagens, logo poderemos partir!

– O que estamos esperando? – berrou uma mulher, com duas crianças pequenas grudadas à sua saia.

– Esperamos a ordem do Rei Greymane – explicou a Rainha, mas o tumulto era imenso. – Nós vamos superar isso! Não entrem em pânico!

Dareon caminhou sutilmente até ela, ignorando os protestos que ouvia enquanto passava, e ajoelhou-se antes que um alarde maior fosse gerado.

– Senhora – disse cortesmente. – Sou Dareon, ao seu dispor.

– Dareon! – a Rainha gritou de repente. – Mas é claro! É um prazer conhecê-lo, meu jovem! Apenas sinto muito pelas condições, não é, quem imaginaria que um dia nossa querida Guilnéas pudesse ser assolada por um mal tão grande?

– Todos sentimos, Senhora.

– Pelo que eu soube, você teve papel crucial na sobrevivência de minha família durante os conflitos na cidade…

Uma jovem bem vestida de cabelos negros aproximou-se devagar e tocou o ombro da Rainha Greymane com carinho.

– Mãe? – chamou ela. – Eles estão vindo para cima de mim agora, o que eu falo?

Os suplicantes pareciam ter aumentado de número e, agora que a Rainha havia se distraído em sua conversa com Dareon, a moça tivera que se esgueirar por uma brecha na meia-lua de aldeões que havia se formado em torno dela.

– Oh, me desculpe, Tess – a Rainha chacoalhou a cabeça, então ergueu a voz e virou-se na direção do tumulto. – Mantenham a calma! Está tudo sob controle!

Calmos era a última coisa que os aldeões pareciam estar. As mulheres gritavam, pedindo explicações com suas vozes estridentes, bebês chorando em seus colos. Os homens, nervosos, brandiam suas bengalas para o alto e faziam ameaças a ninguém em especial, berrando aos quatro ventos que iriam embora por conta própria se tivessem que esperar muito mais por uma providência da família real.

– Dareon, por favor, você precisa falar com Genn – a Rainha pediu baixinho, em meio às tentativas frustradas de acalmar os ânimos dos aldeões. – Ele está trancado no observatório desde o início desse suplício… Tenho certeza de que deve estar trabalhando em algum plano pelo bem do povo, ele é um sujeito bem teimoso…

Dareon assentiu brevemente e abriu caminho pela multidão aglomerada. Antes que alcançasse as escadas, no entanto, uma mão tocou-lhe o braço delicadamente e o puxou com gentileza para o lado.

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– Obrigada por salvar nosso povo – disse a Princesa Tess Greymane, acanhada. – Dareon… Você precisa falar com o meu pai.

– Eu posso tentar, mas…

A Princesa o encarou com um olhar desesperado e apertou sua enorme pata com as duas mãos.

Por favor, Dareon – implorou ela. – Nós precisamos sair daqui… Isso está fugindo do nosso controle. Meu pai… Ele não quer deixar o Solar, eu tenho medo de que a situação só piore daqui para a frente…

– Se acalme, princesa – sussurrou ele, enquanto Tess se recompunha brevemente e jogava os longos cabelos para trás. – Vou fazer o possível para convencê-lo a ir embora. Não há motivo para desespero… Por enquanto, ajude sua mãe. Sua Majestade, pobrezinha, está se vendo louca com tanta gente gritando ao redor dela…

A Princesa olhou para baixo, entristecida.

– Eu sei que está – disse baixinho. – Obrigada mais uma vez. Eu só tenho muito medo de que algo aconteça à minha família…

– Vai ficar tudo bem – Dareon prometeu sorrindo, mas logo se arrependeu. Não havia maneira de prever o futuro, especialmente em meio a tanta bagunça.

Gentilmente, Dareon recolheu a pata do meio das mãos da Princesa e lançou-lhe um último sorriso retraído. Tess Greymane acompanhou-o com o olhar até que finalmente desapareceu nas escadas do Solar.

Dareon subiu até alcançar a saída que o levava diretamente ao início das escadas do Observatório do Rei, uma torre imensa erguida sobre um enorme palanque de madeira, com vista para quase todo o território de Guilnéas.

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É realmente bonito, apesar de trágico, pensava enquanto subia as escadas em espiral, olhando para a paisagem devastada cada vez mais de cima. Não é de se espantar que o Rei relute tanto em abandonar este lugar…

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            Quando alcançou o topo da torre, o Rei Genn Greymane não se virou para cumprimentá-lo. Parecia absorto em pensamentos, encarando o horizonte a olho nu ao lado de seu magnífico telescópio, uma das mãos segurando inutilmente sua espada desembainhada.

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– Olá? – Dareon chamou cautelosamente.

O Rei demorou alguns segundos para se virar e, quando o fez, precisou lançar um segundo olhar para reconhecer seu visitante.

– Ah – disse ele, virando-se na direção da cidade novamente. – É você. Fico feliz que tenha se recuperado bem.

– Nós precisamos ir embora – Dareon disse diretamente. – Sua família está preocupada, está um caos lá em baixo…

Pobre Guilnéas… – o Rei suspirou. – Como foi que chegamos a esse ponto? Eu deveria fazer desta cidade um lugar feliz!

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Dareon deu alguns passos para perto de Genn Greymane e balançou a cabeça.

– Não pode se culpar por isso tudo – disse calmamente. – Essas são forças que estão fora do seu p…

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A torre balançou violentamente, atirando Dareon contra a pequena amurada de madeira. O Rei segurou-se na base do telescópio e os dois se entreolharam por um momento, assustados, sentindo a força do terremoto chacoalhá-los junto com a torre. Permaneceram imóveis até que a terra parou de tremer, uma eternidade depois, e quando acharam seguro, levantaram-se depressa.

O Rei apressou-se em girar o telescópio. Alguns segundos depois, afastou o rosto da lente e, a julgar pela expressão terrível que estampava seu rosto, Dareon soube que algo muito grave havia ocorrido antes mesmo de ouvir as palavras derradeiras:

– O Refúgio do Ocaso, Dareon! Está destruído! – Genn Greymane empurrou o telescópio para que Dareon pudesse ver. – Olhe! Olhe em que se transformou o último lugar seguro de Guilnéas!

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