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Este é o 2º artigo de 46 posts da série Entre Homens e Lobos.

Boa leitura!


Enquanto ajudava Liam a combater os worgens, como aprendera a chamar as aberrações que fundiam homem e lobo, Dareon procurava suprimentos que pudessem ser resgatados e os amontoava em um canto sempre que conseguia. Quando achou que a área estava relativamente mais livre de ameaças, coletou tudo e levou os alimentos até a senhorita que havia lhe pedido ajuda.

– Que bom que ainda está aqui – disse a ela, ajudando-a a encaixotar tudo. – Não conseguia mais avistá-la.

– Fiquei escondida ali atrás – respondeu a moça, indicando a carroça com o queixo. Estendeu a mão para cumprimentá-lo, quase deixando sua enorme espada cair. – Sou Gwen Armstead, a propósito. Muito, muito obrigada por me ajudar! Tomarei providências para que tudo seja levado para um lugar seguro.

– Certo, tome providências – apertou-lhe a mão gentilmente. – Sou Dareon. E acho melhor tomar cuidado com essa espada…

– Oh, eu nem sei usar essa arma – Gwen deu uma risadinha e ergueu-a com as duas mãos. – Mas acho que se eu ficar parada aqui com ar ameaçador, talvez os worgens vão para outro lugar.

Dareon teve de rir diante da espontaneidade da moça. Sentia-se melhor por saber que alguém ainda conseguia manter o senso de humor naquelas condições.

– É melhor eu ir – disse com um aceno – Esses animais estão devastando Guilnéas! E você, pode gritar se precisar.

– Gritarei – Gwen piscou e novamente correu para trás da carroça, ainda se esforçando para equilibrar sua espada. – Mas não vou ficar por aqui, preciso levar esses alimentos para outro lugar.

– Oh, então tome cuidado. Até mais, senhorita.

Dareon correu novamente até Liam, que havia conseguido se livrar da maioria dos worgens que o atacavam com a ajuda de alguns soldados. Mesmo assim, sua voz parecia fraca e cansada quando lhe falou.

– Não adianta, Dareon – suspirou. – Eles não estão desistindo. E os civis… não estão mais em segurança, nem mesmo dentro de suas casas. Estamos fazendo tudo o que podemos para impedir que os worgens as invadam, mas eles são muitos.

– Eu poderia ajudar a tirá-los de casa, se Vossa Alteza achar melhor assim – disse Dareon.

– Hum – Liam pensou por um segundo –, sim, acho que é uma boa ideia. Evacue a Praça dos Mercadores, o exército do meu pai no Distrito Prisional conseguirá protegê-los melhor. E pare de me chamar de Alteza! Por onde você andou nos últimos anos, rapaz?

– Por aí, senhor. Andei… por aí.

Dareon correu de porta em porta, batendo vigorosamente até que alguém atendesse ao chamado. Então, pelas pequenas frestas que lhe eram abertas, explicava a situação aos cidadãos amedrontados e mandava-os ao Distrito Prisional, onde seriam melhor abrigados.

Quando conseguiu evacuar todas as casas possíveis, voltou correndo para informar ao Príncipe.

– Bom trabalho, Dareon – disse Liam. – Graças a você, muitos guilneanos viverão para contar a história. Mas agora é hora de partir – o Príncipe lançou-lhe um olhar duro. – Mesmo. Junte-se aos outros civis no Distrito Militar.

– Oh – Dareon assentiu, desapontado. Por mais exausto que estivesse, aquela adrenalina repentina havia deixado-o agitado demais para descansar. – Sim, senhor.

– Ah, Dareon – Liam chamou-o novamente quando já ia se virando para partir. – Fale com a Gwen quando cruzar a ponte a sudeste – o Príncipe corou. – Só para… saber se está tudo bem. Eu ficarei aqui com os guardas para cuidar da retaguarda. Agora vá. .

Dareon seguiu as ordens reais e percorreu toda a Praça dos Mercadores até chegar na ponte que o levaria até o Distrito Militar. Quanto mais adentrava a cidade, parecia que maior era a quantidade de worgens infiltrados. Esgueirou-se por cantos e becos, evitando as criaturas, que, em sua maioria, ocupavam-se combatendo os soldados da guarda de Guilnéas.

Quando alcançou a ponte, Dareon pôde enxergar a figura de Gwen Armstead à distância, já no Distrito Militar, cercada dos civis que ele próprio havia enviado.

– Gwen! – exclamou quando aproximou-se do grupo. – Sou eu, de novo. O Príncipe me enviou. Como estão as coisas por aqui?

– Oh, olá mais uma vez – respondeu ela. – Estamos bem… Um pouco abalados, mas vivos. Também há worgens deste lado da cidade. Assim que localizarmos todo mundo, vamos continuar a seguir para o sul – ela estalou os dedos delicadamente. – Oh, que cabeça a minha! Acho alguém quer falar com você. Uma mulher chamada Loren andou perguntando por você… Ela me pareceu um pouco decepcionada quando eu disse que você estava bem. Acho que ela falou que lhe deve dinheiro.

– Oh – Dareon revirou os olhos. Não tenho sossego. – Típico. E onde ela está?

– Hum – Gwen apontou para a frente. – Não sei ao certo, mas a vi indo nessa direção. De qualquer forma, nós já estamos indo por ali, só vou esperar mais um pouco para me certificar de que não deixamos ninguém para trás. Daqui a pouco o alcançaremos.

– Certo – respondeu Dareon sem muita convicção. – Até logo, então…

Dareon seguiu pela rua indicada, procurando a figura esguia de Loren em cada esquina. Após alguns segundos, ouviu uma voz conhecida e quase sorriu ao virar-se em sua direção.

– Ei! Aqui!

– Está ficando boa nisso – disse Dareon, identificando-a em meio às sombras de um beco escuro, armada e em posição de combate.

– Sempre fui – Loren riu. Era morena, pequena e atarracada, e seu rosto tinha a mesma expressão desafiadora de que Dareon se lembrava. – É bom tê-lo novamente por aqui.

– Sinto não poder dizer o mesmo. A cidade está um caos! Preferia meus dias de tranquilidade. Olha só, até você anda se escondendo.

– Oh, tranquilidade é algo que não temos há muito tempo – suspirou.

– E meu dinheiro, você tem?

Loren riu.

– Isso lá é hora de me cobrar? – deu-lhe um tapinha fraco no braço. – É claro que não tenho. De qualquer forma, não foi por isso que perguntei por você. Agora estou ensinando minhas habilidades aos cidadãos que se interessem. Mas olha só, não tem jeito de ensinar coisa alguma com esses worgens tentando arrancar nossas cabeças. Temos que pensar seriamente em seguir para o sul com os outros sobreviventes. O Rei Greymane está lá. Se ficarmos juntos, nossas chances de sobrevivência aumentarão.

Dareon examinou-a enquanto falava. Não baixara a guarda uma única vez, e, mesmo conversando, estava atenta ao seu redor. Apesar de seu olhar ostentar a mesma dureza de sempre, agora já não tinham mais o ar brincalhão e simples da garota com quem crescera.

Nunca soube ao certo se queria abraçá-la ou bater nela.

“É melhor que queira me abraçar”, a menina Loren respondera-lhe certa tarde, depois de fazer com que a seguisse correndo pelas ruas de Guilnéas. “Se tentar me bater, eu te bato antes.”

– Hum… vou pensar se quero mesmo ter você por perto – falou Dareon em tom de brincadeira.

– Dareon! Nós precisamos nos manter em grupos, não podemos nos arriscar. Quanto mais, melhor! Nós…

Foi uma brincadeira, pensou, chateado. Não havia mais espaço para vida naquela cidade, da forma que fosse. O que foi que fizeram com vocês?, quis perguntar.

– Certo, Loren – respondeu, sério. – Já entendi.

Avistaram Genn Greymane na praça do Distrito Militar, cercado por cidadãos guilneanos e soldados da Guarda Real de Guilnéas.

– Venham para cá, vocês aí! – gritou um guarda. – Não fiquem no meio da rua.

– Vossa Alteza – falou Dareon, ajoelhando-se rapidamente ao lado de Loren em frente a Genn Greymane. – Sou Dareon, ao seu dispor.

– Levantem-se, jovens, levantem-se – disse o Rei, dando-lhe uma palmadinha nas costas. – Vocês fizeram muito bem em vir para cá. Se nós, os guilneanos, nos mantivermos unidos, conseguiremos derrotar esse terrível inimigo.

Loren concordou e pediu licença para se retirar. Dareon observou-a caminhar rapidamente até uma parede de pedra e encolher-se, com uma das mãos segurando firmemente sua adaga.

– E você… Bem, já que está aqui… Conhece Lorde Darius Crowley? Ele já foi chamado de muitas coisas: rebelde, traidor, terrorista… Antes da rebelião, eu o chamava de… amigo – Greymane suspirou. – Sabe, agora há algumas… hum, antigas diferenças entre nós. Eu nunca o culpei por ter liderado uma rebelião contra mim. Suas terras e seu povo haviam sido isolados de Guilnéas por uma muralha de pedra… mas não tivemos escolha, Doran.

– Dareon, senhor. Alteza.

– Sim, sim, Dareon, que seja – Greymane deu de ombros. – Estou lhe contanto isto porque, apesar de tudo, Crowley é exatamente o tipo de pessoa de que precisamos agora. Por gentileza, Dareon, vá até a prisão Guardapétrea e pergunte ao capitão Broderick sobre o paradeiro de Lorde Darius. Eu mandaria meus homens, mas… ainda há muita hostilidade por lá.

– Com a sua licença, Vossa Alteza – disse um homem que permanecera ao seu lado durante todo o discurso –, mas se me permite a intromissão, acho que devíamos largar Crowley na prisão com aquelas feras…

– Chega, Godfrey – o Rei cortou-o. – Já me decidi. Precisamos de Crowley do nosso lado.

Lorde Godfrey bufou e encarou Dareon.

– Greymane quer arriscar sua vida para salvar a pele daquele traidor – falou. – Por mim tudo bem, mas mesmo assim… Que perda de tempo. Bem, aproveitando o ensejo, já que você vai ter que ir até lá mesmo, nos faça um favor e mate alguns desses malditos sacos de pulga.