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Este é o 8º artigo de 23 posts da série Renegada.

 

Viu Artura aproximar-se vagarosamente e parar ao lado do Comandante Avançado da Ofensiva, pairando a um metro e meio do chão. Halie tentou ignorá-la, mas a sombra que suas asas deitavam sobre o pátio a estava deixando irritada, bem como a expressão de quase piedade com que a val’kyr lhe encarava.

– Não vou mentir para você, Halie – disse o Comandante numa voz subitamente cansada. – É praticamente suicídio que pedirei que faça. Sua chance de fracasso está perto de 95%.

Halie aguardou alguns segundos, absorvendo a informação.

– E por que me pediria para fazer uma coisa dessas? – perguntou, magoada.

– Porque… nós…  confiamos em você – o Comandante respondeu em voz baixa. – A sua chance de falha é de 95%, possivelmente a de qualquer outro seria de cem. Em todo caso, todas as comunicações vindas do Posto Mirante do Medo cessaram. Com o worgens nos atacando sem trégua, não temos como ir até lá ver a situação dos soldados. Preciso que você vá para o Posto Avançado, ao sul daqui, e veja o que está acontecendo. Daqui por diante, manterei contato com você pelo D.C.R. E por favor, afaste-se da estrada principal.

Halie piscou algumas vezes sem necessidade, sentindo a água da chuva escorrer por seus cabelos ressecados até ensopar-lhe as vestes. Deu meia volta com um movimento brusco e saiu pisando o mais forte que se atrevia durante boa parte do caminho. Até atreveu-se a passar perto da estrada principal, mas precisou correr em meio a catapultas e gases tóxicos que atacavam os incontáveis worgens que tentavam montar um cerco na região do Promontório Setentrional.

Depois de atravessar um caminho que serpenteava através de árvores, subia colinas e a deixava sem saída a não ser se arrastar sobre poças de lama, Halie chegou ao topo de um morro, de onde podia enxergar todo o Mirante do Medo.

Horrorizada, tapou a boca com as mãos.

– Comandante! – berrou para o D.C.R., erguendo-o na altura do rosto. – Comandante! Comand… – o dispositivo estalou em suas mãos e chiou fortemente. Logo após, foi possível ouvir a voz do Comandante, entrecortada pelos barulhos da estática.

– Alô! Halie!

– O Mirante do Medo caiu – disse ela, descendo até o local deserto, agradecendo mentalmente o fato de não possuir mais o sentido do olfato. – Há criaturas… aberrações… e soldados da Vanguarda dos Renegados, todos mortos, queimando!

– O Mirante do Medo era nosso posto avançado mais bem protegido – murmurou o Comandante, desolado. – Isso é mau…

– Quão mau? – quis saber Halie.

– Muito – o Comandante permaneceu em silêncio durante alguns segundos. – Se o Mirante do Medo caiu, então… então perdemos Guilnéas.

Halie agachou-se atrás de um poço de pedra. Não fazia ideia do que dizer.

– C-como assim? – grasnou numa voz estridente. – E agora?

Ao lado do Mirante, os worgens continuavam correndo pela estrada principal em direção ao Comando Avançado dos Renegados, mas a fumaça era tanta que Halie duvidava que conseguissem enxergá-la. De qualquer forma, permaneceu imóvel, espiando por cima da borda rachada do poço, sentindo-se cada vez mais desesperada.

– O próximo posto avançado é a Guarda de Rutsak – disse o Comandante. – Fica a leste do Mirante do Medo. Vá até lá e encontre o Capitão Rutsak. Halie, evite os worgens… Você não vai querer enfrenta-los sozinha, acredite.

– Às suas ordens, Comandante – respondeu numa voz resignada.

– Esteja preparada para o pior – disse ainda o Comandante antes de desligar, o que rendeu à Halie mais alguns segundos de uma deprimente reflexão.

Ergueu-se lentamente e aguardou o momento certo de cruzar a estrada, quando nenhum worgen estivesse à vista. Hesitou em três oportunidades, mas na quarta passou correndo e não parou até avistar a pequena base que só podia ser a Guarda de Rutsak.

Ficava tão próximo à Guilnéas que podia avistar claramente suas muralhas se erguendo ao fundo. Quase ficou aliviada por encontrar o lugar, mas então notou a fumaça preta que cercava-o e novamente foi tomada pelo pânico.

Entrou afobada na pequena casa de madeira que servia de sede ao posto e encontrou um Renegado apavorado.

– Capitão? – perguntou Halie, aproximando-se lentamente. – Capitão Rutsak?

O pobre morto-vivo encolheu-se ainda mais.

– Vim do Comando Avançado – prosseguiu Halie, sem saber como acalmar o Capitão. – Meu nome é Halie. Estou aqui para ajudá-lo! O que…

De repente, a voz de Rutsak saiu em pequenos gritos trêmulos.

– Th… Af… Quando… Guilnéas caiu… o… o p-porto c-caiu também – disse, e então encarou-a. – T-TEM HUMANOS AQ-Q-QUI! Reforços de Ventobravo! Eles chacinaram meus homens. Me deixaram vivo para testemunhar sua f-força. D-diga ao Alto Comando… diga a eles que a 7ª Legião está aqui.

Halie sentiu sua boca abrir-se involuntariamente. Subitamente, uma memória distante, de outra vida, lhe assaltou os pensamentos e, sem querer, lembrou-se da admiração que um dia sentira pela 7ª Legião.

“Eles são a elite”, dissera a uma garota de cabelos negros quando esta lhe perguntara sobre. “Não são cavaleiros, Ellis. São filhos da Aliança, que provam seu valor durante cada batalha. Os soldados da 7ª Legião são escolhidos pela vida.”

“Nós podemos fazer parte da 7ª Legião um dia?”, questionara a menina, uma cópia sua com quatro anos a menos. Seus grandes olhos azuis fitavam-na com curiosidade.

Halie havia rido. “Quem sabe?”, respondera com um sorriso.

– A 7ª Legião… – continuou Rutsak – Eles nos surpreenderam na calada da noite. O capitão deles rugia ordens enquanto os tripulantes do submarino massacravam meus homens – sua expressão tornou-se sombria de repente. – Então ele chegou perto de mim, aproximou o rosto do meu e disse algo que jamais esquecerei…

– O que foi que ele disse, Capitão? – Halie precisou perguntar quando o tempo de silêncio do Capitão Rutsak se prolongou demais.

– Ele disse… disse “meu nome é Primeiro-Sargento Pietro Zaren, oficial da 7ª Legião. Quando você vir seus soldados sendo massacrados em seus pesadelos, se você ainda for capaz de sonhar, lembre-se do meu nome e trema de pavor”.

Halie olhou-o com compaixão e sentiu pena diante do estado em que o Capitão se encontrava.

– H-halie? – gaguejou Rutsak, segurando-a pelos ombros, com um novo calor na voz. – Você p-poderia… poderia ir até lá!

– Até onde, Capitão?

– Até lá – gritou ele, apontando vigorosamente na direção da muralha de Guilnéas. – Vingue nossos soldados! Mate os membros da 7ª Legião!